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segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Entrevista com uma educadora - Gladys Beatriz Barreyro

A Profa. Dra. Gladys Beatriz Barreyro é professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da USP. Em razão da reportagem sobre rankings universitário na edição da revista ComCiência sobre Avaliações de Ensino, ela gentilmente concedeu uma entrevista por email sobre o tema. Abaixo reproduzo a entrevista no íntegra - já que nem tudo coube no texto da reportagem.

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1) Um comitê norueguês classificou os rankings como inúteis em função da subjetividade dos pesos atribuídos aos itens aferidos e falta de transparência da metodologia. A senhora concorda com essas críticas? É possível se corrigir essas limitações?

GB. Os rankings internacionais têm a função de hierarquizar universidades de pesquisa. Eles recebem muitas críticas pela metodologia, que às vezes muda de edição a edição e que privilegia a pesquisa, não considera ou minimiza o ensino, ignoram ciências sociais ou humanidades, consideram apenas as publicações em inglês ou a quantidade de prêmios Nobel, ou seja, simplificam as atividades das instituições de educação superior e as padronizam.

Concordo com essas críticas.

O “sucesso” deles é porque simplificam os resultados e, num mundo competitivo, comparam as instituições e isso facilita a divulgação, a compreensão e tem apelo de público e de mídia.
Quanto a corrigir as limitações, sugiro que pergunte aos adoradores e defensores dos rankings!

2) Quais as consequências - positivas ou negativas - de se moldar políticas públicas para o ensino superior moldados em rankings universitários?

GB. Se são utilizados os rankings como único elemento, dadas suas limitações e falhas, teremos dados falhos no diagnóstico ao momento de elaborar uma políticas pública.

Indo ao caso brasileiro, como não há rankings oficiais, se as políticas se basearam em resultados de rankings internacionais elas teriam todos esses problemas, mas o fato de ignorar as prioridades nacionais para a educação superior, estariam baseados apenas em critérios externos. Além disso, no Brasil existem distintos tipos de instituições não apenas as universidades para as quais a indissociabilidade pesquisa-ensino-extensão é um requisito.

A questão da equidade no acesso à educação superior tem sido uma das prioridades de política na última década e ela não foi produto da influência de nenhum ranking internacional, pois não é um quesito considerado neles, porém tem sido uma prioridade nacional.

Além disso, não deve ser esquecida a autonomia das universidades quando se pensa em políticas públicas para a educação superior.

3) Com frequência quando se estabelecem classificações e medidas de avaliação, há tentativas de burla do sistema: como contratação de mestres e doutores em época de avaliação e demissão após o período. Considera que esses rankings são robustos contra a estratégia do "gaming" dos parâmetros e das burlas?

GB. Os rankings, pelos menos os internacionais mais “famosos”, com maior divulgação, priorizam pesquisa, geralmente considerando o número de publicações, prêmios Nobel, etc. então não estão interessados no número de mestres e doutores. A questão da titulação de mestres e doutores, da condição de tempo integral ou horista é relevante na avaliação da educação superior brasileira, notadamente para o Sistema Nacional da Educação Superior – SINAES, esse é um parâmetro importante para a avaliação de cursos e de instituições. Ele é imporatante na composição do indicador – CPC (conceito preliminar de curso) que mostra resultados da avaliação dos cursos no Brasil.

4) Em relação ao Enade, considera que a avaliação tem atingido o objetivo de mensurar a qualidade dos cursos e das IES brasileiras? Em caso negativo, quais as falhas principais e o que considera que deveria ser feito? Em caso positivo, há melhorias a serem feitas (quais)?

GB. Quem avalia a qualidade dos cursos e das IES brasileiras é o SINAES (Sistema de Avaliação da Educação Superior Brasileira) do qual o ENADE é apenas um dos instrumentos, junto à avaliação de instituições e cursos.

O exame ENADE avalia os alunos, ou melhor, os resultados da aprendizagem dos alunos. Isto não pode ser confundido com a qualidade de cursos e instituições, apenas é um componente. Contudo, com a criação de índices como o CPC que considera os resultados do ENADE e os supervaloriza, lamentavelmente, ele extrapola sua função. Tem que se considerar os três elementos da avaliação tal como o SINAES propõe.

Além disso, as próprias instituições devem criar uma cultura de avaliação, se auto-avaliarem e se preocupar com a qualidade. E os usuários da educação superior deveriam ser mais exigentes quanto a isso, especialmente naquelas de escassa qualidade.Finalmente, a mídia destaca excessivamente os resultados nos rankings internacionais, mas dedica pouco espaço a matérias serias sobre qualidade e sobre o Brasil, destacando casos negativos ou propondo que se copie o sistema de educação superior de X país, ignorando as diferenças entre os países.
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Este trabalho foi desenvolvimento com apoio financeiro da Fapesp (Bolsa Mídia Ciência), sob supervisão da Profa. Dra. Simone Pallone e Dra. Katlin Massirer.

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